"Do the Chameleon!"


Costumava identificar-me bastante, só cá para mim, com a figura do camaleão. Era um pouco aquela ideia que o Woody Allen explorou no hilariante Zelig: um homem com um carácter tão inseguro e de personalidade tão volátil que logrou desenvolver a capacidade de se transformar nos personagens dos quais se aproximava, mesmo fisicamente: junto de uma comunidade de judeus ortodoxos, crescia-lhe automaticamente uma barba, junto de muçulmanos, surgia vestido de túnica e a recitar de cor o Corão, aproximando-se de pessoas obesas, começava imediatamente a inchar como um balão, com índios, desenvolvia uma tonalidade de pele avermelhada e era vê-lo a fumar alegremente uma cachimbada. Enfim, penso que perceberam a ideia. A particularidade do filme reside no seu embuste: trata-se um documentário totalmente ficionado, cuja acção de desenrola nos anos 20, tendo sido utilizados inúmeros truques que permitiam revestir as imagens de verosimilhança (alternância de imagens reais de época, envelhecimento propositado da película, etc.).
Quanto a mim, ficava-me pela mimetização de tiques e expressões, como um riso ou uma frase recorrente de alguém, ou mesmo pela imitação de um gesto (já para não falar das roupagens com que me ornamentava...) ou a conversão aos gostos de outrém. Era um processo subreptício (ou reptilíneo?) que rapidamente me colocava numa situação garantida de afinidade. Achava eu.
Qual o meu espanto quando o malvado réptil ressurge na minha vida, em plena dinâmica de grupo numa aula, como símbolo da minha preocupação educativa central. Nos tempos que correm, contudo, atribuí-lhe um significado bastante diferente. A ideia era recorrer a processos simbólicos e plásticos para traduzir a nossa principal preocupação educativa. Pensei de imediato na ideia de que a identidade de alguém se transforma necessariamente consoante os contextos, sem deixar de se manter ela própria, não obstante. O desafio seria, como tal, criar condições para que essa diversidade se pudesse exprimir de forma livre ou agenciada. O camaleão é-o pela sua capacidade de mutação constante, é aí que reside o seu perfil identitário. Então sou reservado e introspectivo num sítio, alegre e expansivo noutro, sério e autoritário uns dias, incapaz de organizar um simples dia de trabalho, noutro, cheio de pluma num bar e macho man num colóquio internacional.
Sim, e depois?

3 Comentários:

  1. Anónimo disse...
    Depois...também não sei!mas talvez a melhor forma seja viver!às vezes doi, mas vale a pena!Pensar, também não é mau , sobretudo como pessoas como tu pensam alto e bem.
    beijos cristina
    Fabi disse...
    Lindo tudo bem??? E aí a saudade tá grande??? :))
    Olha manda beijinhos ao César quando falares com ele tá????
    Bom São João!
    beijosssss
    Fabíola
    Major Tom disse...
    a ideia era mais "e depois? qual é o problema?". É que eu sinto-me mesmo diferente conforme os cenários, e até confesso um gozo interior em jogar com o primeiro impacto que provoco nas pessoas. Mas acredito que a maior parte do tempo o fazemos insconscientemente, apenas preferimos acreditar que continuamos os mesmos...

Deixe um comentário







Recomenda-se


Outras paragens



anodaorquidea[at]gmail.com
 

© O Ano da Orquídea 2004-2007