Incredible!
Talvez seja implicação minha, e contra mim falo, que até sou fã dos filmes da Pixar (e não é isto que seguramente me vai afastar do seu cinema), mas dei comigo em considerações filosóficas logo pela manhã, quando iniciava uma das minhas actividades preferidas naquele limbo a que chamamos despertar: comer leite com flocos e ler as embalagens, hoje em dia pródigas em profusões de pormenores e informações coloridas. Desta vez cruzei-me com a promoção do The Incredibles, o que incluia a promessa de novos brinquedos, filhos do imaginário merchandising que hoje nos reservam o interior destas caixinhas de cartão. Uma descrição breve das personagens do filme despoletou a crise: não é que, mais uma vez, temos uma história com uma família tradicional no centro? Dirão: sim, mas esta será tudo menos convencional! Vamos então aos super poderes que os distinguem do comum dos mortais: o pai - personagem principal (pasme-se!) - poder: a força! A mulher, como convém, distingue-se pela sua extraordinária... agilidade e elasticidade! Os filhos: ele, super rápido (como convém), e a rapariga é capaz da mirabolante proesa de... tornar-se invisível!! É impressão minha ou temos aqui o papeis sociais vestidos de mito? Nada de espantar, se calhar, se considerarmos o panorama cinematográfico actual (especialmente o norte-americano). Mas se pensarmos, por um lado, na capacidade que a Pixar tem demonstrado em se colocar do lado de personagens de alguma forma desenquadradas e relembrando o poder dos media no processo de desenvolvimento psicosexual, por via da modelagem, das crianças e adolescentes... há qualquer coisa de perturbadoramente anacrónico nesta abordagem. A não ser que (e o facto é que ainda não vi o filme) a Pixar tenha sido capaz de brincar com os estereótipos e se lançar numa via de auto-ironia...
It just makes me wonder...
Nas noites frias...
É assim que temos passado as últimas noites, por baixo do edredon quentinho da nossa cama e na companhia destas simpáticas pessoas... Graças ao Pedro e aos seus mágicos downloads, estamos a conseguir ver alguns episódios da série "Queer as Folk"! Que vontade de ver a série toda!!
O amor científico
A ciência nunca teve (e não o tem seguramente agora) pejo de entrar no corpo pela sua orgânica, e aí não nos poupou à descrição minuciosa dos fluídos, dos órgãos, das células, ou, mais recentemente, dos códigos genéticos. Mas quando se retoma o corpo como veículo da alma e das suas emoções, aquilo que nos transporta de um a outro é matéria na qual a ciência tem, prosaicamente discursando, atolado. Se retirarmos algumas esforçadas tentativas de esmiuçar o dilema (como a de Descartes no célebre Tratado das Paixões da Alma), o que temos é um reinado onde, entre outras, as coisas do amor não entram, ou, se quisermos, entram pela porta das normas e dos regulamentos sociais, neles se deixando banhar, provocando a submersão do corpo como objecto de desejo, e a sua emersão como mero objecto de estudo e controle anatómico, psicológico ou social. É este ainda o ponto da situação, em pleno início de milénio, e nele derraparemos até que corpo e ciência ganhem coragem para se olhar nos olhos e confiar no futuro, com paixão na razão e razão na paixão, misturando e dissolvendo, entre outras coisas, as barreiras que as têm separado.
A 7ª arte na Invicta
Águia D'Ouro, Batalha, Sala Bebé, Pedro Cem, Passos Manuel, Estúdio Foco, Lumiére, Trindade, Cinema do Terço... É grande a lista de salas de cinema que nos últimos anos fecharam no Porto. Os cinemas de rua deram lugar aos multiplexes dos shoppings da periferia, às pipocas e aos filmes-padrão hollywoodescos. Aos poucos o cinema independente, "alternativo", foi perdendo lugar neste mercado, aparecendo hoje em dia nos cinemas da Medeia e em ciclos temporários. Quando iremos ver uma extensão da programação da Cinemateca Portuguesa ao norte do país?
Longe vão os tempos os quais o cinema tinha um peso importante na cidade; bom exemplo dessa importância era a produção cinematográfica dos estúdios Invicta Film.
Será um bom prenúncio a reabertura do Passos Manuel ou a recente programação do cine-estúdio do Teatro do Campo Alegre?
O grande teatro do mundo (parte 2)
De referir ainda que estas peças que fomos ver ontem fazem parte da programação da 4ª edição do PoNTI – Porto. Natal. Teatro. Internacional. Este ano coincide com a organização do XIII Festival da União dos Teatros da Europa. Como o Major Tom comentou comigo, isto equivale à organização do Euro 2004 mas na área teatral. :)
O grande teatro do mundo
Regresso ao teatro. Acertada a minha intuição. Valeu a pena escolher esta apresentação 'dois em um' de dois textos fortíssimos: Die Glasmeagerie do americano Tennessee Williams (já adaptado ao cinema pelo Paul Newman)...
... e outro da outsider (cada vez mais in) Sara Kane - Zerbombt.
Dois pequenos tratados sobre a natureza humana, duas lições de entrega teatral no belo cenário da Helena Sá e Costa, pela companhia alemã Schauspielfrankfurt (e é bom reencontrar a Micas nestes acasos, também ela a preparar-se para a temporada com outra peça no São João, novamente com o charmoso João Reis).
Presente!
Parece que uma semana fora me desabituou da escrita. Talvez seja a própria vida a dizer-me que tenho que a agarrar com unhas e dentes, sem condescendência. Naturalmente, acabo por reequacionar novamente o papel deste espaço. Novidades: após um período ausente, lá acabo por conseguir assistir às minhas primeiras aulas de mestrado (fiquei a saber que tinham colocado a hipótese da minha desistência). Professores e conteúdos entusiasmantes, coleguinhas participativos e experientes, e, acima de tudo, sentir-me intelectualmente reestimulado. Só agora me apercebo como o meu cérebro agradece este tipo de massagem.
Frio, sol e cerejas
Como gosto destes dias de Inverno, com muito frio, mas repletos de sol! Apetece passar a tarde a caminhar e sentir aquele friozinho na cara e depois passar a noite à volta de uma lareira, a comer e conversar com os amigos.
Por falar de frio, vejam o que recebi esta semana na minha caixa de correio:
Cerejeiras congeladas!
Alguém sabe onde posso ver um espectáculo destes? É lindo!
"We'll always have Paris"
Em mais uma corrida com esta bela luz de Outono, chapinhando nas folhas secas do parque, ia pensando no efeito que este périplo por terras de França teve em mim. Talvez seja demasiado cedo para o perceber, estas coisas precisam do seu tempo para encontrar um lugar na nossa caixinhas de memórias, aquelas às quais regressamos quando nos surgem dúvidas sobre o que fazemos aqui afinal. Seja como for, a impressão que tanto o mundo rural da Borgonha como o urbanismo esmagador e sofisticado de Paris me causou não podia ter sido mais forte. Em Macon, pontos altos: visitar a produção de sabonetes feitos com leite de burra, cujas qualidades terapêuticas foram magistralmente explicadas pela simpática Julie; as danças tradicionais da região do Lang-Doc, na qual participaram todos os parceiros italianos, franceses e portugueses do encontro transnacional.
Findo o Seminário, experimentei o eficientíssimo (e caríssimo) TGV para uma escapadela à capital francesa. Foi bom tê-la partilhado com dois amigos de Turim, que me revelaram alguns dos segredos mais bem guardados da cidade.
Segredos como entrar na intimidade deslumbrante e estranha da livraria Shakespeare, onde vagueam cabeludos de olhar distante, imersos na leitura em cantos caseiros ou entabulando diálogos como este:
"-Does he have a heart?"
"-He does, it's just pumping on the wrong side."
Apercebi-me depois que tinha sido aqui que a Julie Deply reencontrara o Ethan Hawke no filme "Antes do Anoitecer".
Ou percorrer a complexa rede de linhas do metro, dando de caras por todo o lado com perfomances musicais de elevadíssima qualidade (incluindo um grupo de música Rom e um acordeonista a oferecer Bach) ou com cartazes deste género:
Vote for Kerry!
É estranho pensar que, qualquer que seja o resultado das eleições norte-americanas, do outro lado da planeta, uma parte considerável do meu futuro vai ser decidida esta noite.
Em nome da fome
Comer é bom! Poucas coisas ultrapassam o simples e primordial prazer de satisfazer a larica e encher o bandulho. Pela manhã, uma rodada de torradas com manteiga, leite fresquinho simples ou sumo de laranja recém espremida, para sossegar o corpo que acorda esfomeado (sim, pertenço a essa parte da humanidade, ao contrário daqueles que enigmaticamente deambulam horas antes de ouvir o apelo do estômago); uma grande fatia de bolo de amêndoa depois de uma sessão de amor (para os fumadores o caso é diferente...); caprichar no peixe assado com batatas e arroz para o jantar que rondou na cabeça o dia inteiro; trincar, petiscar, lamber, deglutir, cheirar ou devorar, enfim, a celebração dos sentidos que nos salvam por momentos da prisão que é ser-se um animal racional. Pouco animal e muito racional.
La petite mort
Um ex-marinheiro falou-me dos seus anos no mar, de como era bom navegar na costa da Guiné e olhar as estrelas ou fundear na costa dos Açores (enquanto soldados americanos das Lajes abarcavam para engatar os seus grumetes?). Parece que em alturas de tempestade no alto-mar, os barcos da marinha, concebidos para por ali andar mesmo com tanta água de mau presságio a inundar o convés e o pensamento, são incapazes de ir ao fundo. Por mais cambalhotas que dê, o casco volta sempre a ficar para a baixo e a torre de controlo para cima. Depois de uma grande vaga (que pode ultrapassar os doze metros de altura), a proa ascende em direcção ao céu, e depois dobra a onda, iniciando uma descida provocada pelo seu próprio peso. Nesses segundos seguintes, a única coisa que se vê é o mar. Por todo o lado, não se vislumbra outro espaço que não seja o oceano e a sua promessa de abismo.
O orgasmo dos homens é para os franceses 'la petite mort'. Poderá ser isto o seu equivalente naval?