Direito ao direito


Ao debater a possibilidade de podermos falar de direitos humanos universais, rapidamente chegamos a uma encruzilhada: como reconhecer a diversidade de perspectivas culturais e éticas que podemos encontrar neste mundo apenas num punhado de leis (ditadas por quem? reconhecidas por quem?). Entre uma perspectiva etnocêntrica, arrogante e imperialista, e uma perspectiva relativista, generosa mas paralizante, parece não haver saída para o dilema. Aida para mais, o critério sexualidade raramente é associado a esta problemática. Recordando o caso dos turistas homossexuais que foram presos num barco no Nilo, atingiu-me este facto: as exigências de libertação das vítimas que choveram sobre as autoridades egípcias não lograram absolutamente nenhum efeito quando feitas com base no argumento do cumprimento dos direitos humanos. Foi necessário fazer ver às forças económicas que a diminuição de turistas, uma das fontes mais significativas de rendimento naquele país, que esta situação poderia ser extremamente gravosa, para que finalmente a decisão da libertação fosse tomada, alguns meses mais tarde. Olhando para outro exemplo, pensei na realidade espanhola, onde as recentes mudanças legislativas que reconheceram o direito de igualdade à população gay e lésbica foram fruto não apenas do activismo, mas também (não me atrevo a dizer sobretudo) pela constatação da importância desta população enquanto mercado (eleitoral e económico). Aproximando-se as eleições autárquicas, confesso que também caí na tentação de pensar que a melhor abordagem aos candidatos no sentido de contemplarem os direitos LGBT poderia ser pondo em evidência a racionalidade económica a longo prazo: uma cidade friendly é uma cidade mais visitada. Não sei ainda até que ponto será importante contemplar esta lógica em termos estratégicos, mas a verdade é que me tem parecido ingénuo batalhar na tecla dos direitos humanos, quando se tem confundido tão facilmente o arauto com o algoz.

2 Comentários:

  1. Anónimo disse...
    As mudanças legislativas em Espanha nunca teriam sido possíveis se não houvesse um sentimento entre os políticos que as promoveram de que seriam bem recebidas pela população em geral. E isso é o que interessa. A mentalidade do cidadão comum em Espanha consegue aceitar esta realidade, o mesmo não acontece em Portugal e em muitas partes do mundo. Os políticos são sempre uma extensão dos seus eleitores. Quando estes em Espanha procuram cativar o eleitor homossexual em vez de o ignorar ou perseguir, penso que se pode subentender muita coisa sobre a qualidade da sociedade. Penso também que é irrelevante o facto de estas motivações serem de carácter estratégicos ou não.
    Major Tom disse...
    Em última análise, também a mim me parece irrelevante, mas acho que temos ficado um pouco à mercê de uma ideia pouco estudada acerca da opinião do português médio. Em relação a este tema, duvido que existam grandes diferenças entre a população piscatória das cidades costeiras da Galiza e uma grande parte dos habitantes do nosso Portugal profundo (que não exclui algumas bolsas urbanas). Ou seja, parece-me que o aconteceu em Epsanha foi mais um trabalho de pressão de mudança de cima para baixo, e é Duvido que alguma coisa consiga ter tanto impacto como um reconhecimento institucional da igualdade. É nisso que em última instância o português médio parece acreditar. E se não, o problema passa a ser só dele.

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