O canto da solidão


Fim de semana musical, com sessão dupla na Casa da Música. Sábado, sem amplificação de som e acompanhado pelo cravo e pianoforte, o enorme e divino Andreas Scholl, que nos presenteou no final com um solo a capela e nos elevou com o seu bel canto ao seu reino, onde habitam, entre outros, Haydn, Häendal e Mozart. No Domingo, decidido à saída do concerto anterior, fui ver (ou experimentar) o Antony e os seus The Johnsons, de quem conhecia muito pouco. Foi uma bela supresa, em vários sentidos: primeiro, confesso que estava atraído pela imagética glam que publicita normalmente o artista; nada de mais enganador, nesta digressão, o homem personifica o anti-look. Claro que é difícil um gigante daquele tamanho passar despercebido, mas ele parecia realmente intimidado pela sala repleta (quando entrou no palco penso que todos pensamos que era apenas um técnico de som). Voz única e um show irrepreensível, belos arranjos para as composições do próprio, com duas excepções: incursões no cancioneiro do Leonard Cohen ("I need you") e Lou Reed ("Candy Says").
Duas vozes em torno da solidão (lonelyness deve ser a palavra mais usada por Antony) e do desamor, os dois temas mais capazes de despertar no Homem arte com letras grandes. A música transcendeu o tempo e instalou-se de vez na impressionante arquitectura que aterrou na rotunda da Boavista, com, dizem os entendidos, a melhor acústica do planeta.

Um dia na vida de...

Segunda-feira, dia 30 de Maio de 2005:

8h20 - Despertador toca.
8h30 - Despertador toca de novo e lá me levanto. Vou tomar banho.
8h50 - Tomo o pequeno-almoço.
9h05 - Saio de casa. Aguardo na paragem. Apanho autocarro: destino baixa do Porto.
9h30 - Chego ao trabalho. Ligo computador, consulto e-mails e começo a trabalhar.
13h30 - Vou almoçar. Tenho ainda tempo para ver se já saiu o último número da Revista Blue.
14h30 - Regresso do almoço. Retomo o trabalho.
18h15 - Chega ao fim mais um dia de trabalho.
18h20 - Apanho autocarro de regresso a casa.
18h45 - Chego a casa. Ainda tenho tempo para fazer um lanchicho.
19h05 - Entro no curso.
21h30 - Termino o curso.
21h40 - Regresso a casa. Major Tom já tem o jantar preparado.
22h30 - Começa mais um episódio da série Sete Palmos de Terra.
23h30 - Termina o episódio (este foi pesado...). Queria que desse outro de seguida.
23h45 - Estou aqui em frente ao computador. Vou para a cama ler um pouco. Programo o despertador. Adormeço.

Nada de muito estimulante, pois não? Assim descritos os dias parecem bem aborrecidos... Esta semana fui dar a um site muito interessante que fala um pouco sobre esta ditadura das horas e das tarefas planeadas, e que nos propõe acompanhar Mr. Brown na sua rotina diária (mas de uma forma muito mais apelativa e original). A não perder esta novela gráfica, digital e interactiva!

Parabéns Orquídea!


Esta semana a nossa orquídea "deu o ar da sua graça" e presenteou-nos com umas lindas flores. Confesso que estava um pouco apreensivo porque estavam a demorar um pouco a nascer. Coincidência feliz ter florido precisamente na mesma semana em que O Ano da Orquídea faz um anito :)

Auto-retrato para um professor intercultural


Brevemente vou começar uma cadeira sobre Educação e Interculturalidade, que será dinamizada por um professor expressamente encomendado do Brasil. Ele teve a interessante iniciativa de criar um fórum online de preparação, deafiando-nos a criar primeiro o nosso perfil. Assim lá deixei o que se segue:

Às trinta primaveras, sou um residente ainda relutante de Vila Nova de Gaia, cidade plantada (por vezes a martelo) em cima do Oceano Atlântico, com uma pequena brecha por onde escapa o Rio Douro, que eu adoro, e por onde se espreita para a simpática cidade do Porto, que eu aprendi a gostar depois de lhe fugir durante um ano. Estudei Sociologia(também de forma relutante, porque também lhe fugi para ir estudar História do Cinema), mas acabei por ir parar à Cruz Vermelha, onde não, não trabalho com hospitais e ambulâncias, mas em programas de intervenção social, especialmente formação para adultos 'desqualificados' e em risco de exclusão. Paralelamente, porque sou cidadão, fui desenvolvendo um pequeno percurso no âmbito do activismo LGBT (lésbico, gay, bissexual e transgénero) e por essa via fui aprofundado competências na área da educação sexual e participando em iniciativas de sensibilização em vários contextos. Tudo isto me dá prazer, se não for ao mesmo tempo e em excesso, porque só consigo olhar para uma coisa de cada vez. Quando for grande quero ter tempo para voltar a ser pequeno, e então dedicar-me a organizar jantares diários com os amigos, a viajar (também admito a minha paixão pelos não-lugares), e a ler todos os livros que se vão acumulando na mesinha de cabeceira, incluindo a obra completa do Italo Calvino em italiano e aquele Paraíso do Lesama Lima que ficou a meio. Ah, também gosto de escrever, e tenho tentado definir-me um bocadinho aqui todos os dias.

Chiaroscuro epistemológico


Já na escola achava que analisar um poema era destruir a sua poesia. Vivemos fascinados com o mistério mas apenas enquanto ele se apresenta como tal. Por exemplo: tenho ideias que me apaixonam durante um curto espaço de tempo como temas passíveis de investigação, mas logo um aprofundamento inicial, uma tentativa de explicação, mina a paixão por esse até aí desconhecido, que começa a sua metamorfose de oculto a exposto, da sombra para a luz. Logo eu, que sempre preferi a penumbra, onde o meu olhar projecta a imaginação, como faziam os grandes pintores fiorentinos com o chiaroscuro. Isto não é o mesmo que dizer que quem não conhece é feliz. A felicidade reside antes na expressão de todas as liberdades, e para isso é importante o conhecimento, enquanto foco que desmonta o mecanimo que lança a sombra sobre os objectos e lhes empresta densidade.

Relembrete

Hoje à noite, temos Cachorro no Pinguim!
Cortesia do GRIP e do Cinema Invisível!

O belo Andreas


Admito que as modas e tendências sempre me fizeram alguma espécie. Este fim de semana, entre um Antony e um Andreas School, optei pelo último. Sacio assim a sede de canto lírico, passo a conhecer a Casa da Música e, pelos vistos, também regalo as vistas...

PS: há sempre a hipótese de conhecer o Antony em Famalicão, no dia 30. Também deve valer a pena, o moço traz fama de bom performer.

Memórias de Celulóide: Sonata de Outono


Não é, dizem os entendidos (clube do qual me excluo), nem de longe nem de perto, o melhor filme de Ingmar Bergman. Mas foi este, decididamente, que marcou para mim o início de uma paixão fervorosa, que ainda hoje queima. O que me fascinava: as batalhas em forma de diálogos, as interpretações absolutamente estonteantes, a forma negra e carnal como a narrativa se entregava aos abismos da alma humana, especialmente nessa substância emocional corrosiva que é a família. Ingrid Bergman regressava assim ao seu país, quando já todos pensavam que havia esquecido o sueco. Entrega-se, humilde, nas mãos do maestro e deixa-se filmar assim de uma forma despida (embora a diva também por lá ande, no retrato de uma pianista cuja fama faz descurar a relação com a filha). Do outro lado do ringue: a insuperável Liv Ulman, à época mulher do realizador. São dela os momentos mais intensos, quase insuportáveis, quando despe a máscara e confessa à mãe todo o fel que lhe vota desde criança. Uma melodia de Chopin, um estranho prelúdio que ainda hoje me hipnotiza, e "que deve soar mal", como diz uma das personagens, serve de banda sonora. E Bergman penetrava no meu coração.

Porque o Um de Dezembro nunca devia ter acontecido:


TVE enseña las bodas homosexuales a los más pequeños a través de «Los Lunnis»

El programa infantil emite un vídeo en el que muestra con naturalidad una boda entre dos hombres

Bajo el título «Bodas diferentes», TVE emitió el miércoles en «Los Lunnis» un reportaje en el que mostró a escolares distintas formas de casarse, una de ellas entre dos personas del mismo sexo. Las críticas ya han comenzado.

R. T.
Madrid- La Ley que permitirá casarse a parejas homosexuales todavía no ha sido aprobada, sin embargo desde Televisión Española ya se está haciendo «campaña» para normalizar esta situación, y ha empezado con un ejercicio de tolerancia hacia los más pequeños. Y qué mejor sitio para hacerlo que en «Los Lunnis», el espacio infantil por excelencia –a falta de otros programas de estas características–, que se emite en La 2 de TVE de 07:30 a 09:30 horas y por la tarde, de 17:30 a 19:00 horas.

in La Razon Digital

Diário íntimo de um trabalhador-estudante


Estou perdido na incapacidade de me traduzir. Faltam palavras e sobram pensamentos e coisas para fazer. Já não sei trabalhar. Os livros acumulam-se, passeio o portátil por todo o lado, e apesar de ser previsível desde o início, reconheço que é difícil gerir esta sensação de não conseguir levar nada até ao fim, semelhante à ideia de estar dentro de uma corrente a tentar conduzir um barco sem remos. Sabemos que o mundo não para, e que dentro em breve há sempre qualquer coisa a acontecer, mas estamos incapazes de agir. Por isso, num Domingo em que o país está outra vez hipnotizado com futebol e em que tudo o que é importante parece perder a sua importância, sabe ainda melhor fazer assim: rodear-me de tentações, fazer de conta que não há segunda-feira e acrescentar em cada uma das divisões da casa um novo capítulo ao manual erótico do Tom of Finland. Pelo menos assim consolo-me com a ideia de que afinal até há coisas que levo até ao fim...

GRIP

E com o Pinguim mais apinhado a que eu já assisti, e com a benção da fada Gabriela, o GRIP declara oficial a sua existência, numa noite para mais tarde recordar, espero eu, como o início de um belo trabalho de cidadania LGBT. O Porto precisa e merece. Parabéns a nós! Para a semana há mais, com a projecção do "Cachorro".

Receita de Fafe


Junte-se doses industriais de machismo ancestral, reproduzido de geração em geração (entre pais e filhos, alunos e professores, maridos e mulheres, amigos e colegas), hábitos de consumo galopante de álcool, uma tradição de porte, licença e uso de armas de fogo, numa terra descaracterizada pelos símbolos do pseudo-progresso (rotundas e outros elefantes brancos), acrescente-se um ódio irracional pelas terras vizinhas, e constate-se a inexistência de um cinema, teatro ou livraria. Misture-se tudo e eis Fafe em todo o seu esplendor.
Um exemplo: uma rapariga que tenho acompanhado no balanço de competências confessava que trabalha já há vários anos numa fábrica de confecções (outro ingrediente típico da região) sempre com a categoria de aprendiz (o que significa na prática que ganha pouco mais do que um valor miseravelmente simbólico). Segundo as suas colegas de trabalho, ainda não foi promovida por ser solteira. O facto importante: ela acreditou.
PS: a imagem é mesmo de Fafe (observem com atenção)

Trinta

Bem, já cá cantam trinta primaveras. E hoje é aquele dia em que tenho que fazer o que os outros querem, nem que o que os outros queiram seja que eu faça o que me apetece. Bem, não me apetece nada, a não ser férias e um país tropical. Alguém me oferece?

Mundo vinho


Em Mondovino, de Jonathan Nossiter, tudo se passa em volta dos possíveis efeitos da globalização sobre a produção de vinho. Entrevistam-se produtores, filmam-se paisagens e culturas, ensaiam-se confrontações de mundos através da inteligência da montagem. O realizador assina assim uma tese, durante quase duas horas e quinze minutos de filme, tamanho invulgar para um formato invulgar que felizmente nos vamos habituando a ver de volta às salas de cinema: o documentário. Sem grandes arrufos de pedagogia, o autor obriga-nos a tomar partido entre a tradição e a preservação da diversidade (apenas aparentemente se fala de vinho aqui) e o gosto globalizado ditado pelo capital. Parece óbvio qual é o partido do autor. Não se ouvem comentários, apenas a sua voz a interpelar em várias línguas os protagonistas de uma espécie de teatro universal entre poderosos e os mais humildes no complexo universo vinhateiro. Seria bom poder fazer assim um investigação, de câmara ao ombro e munido apenas de ideias de fundo, trabalhadas mais tarde numa sala escura. A diferença principal parece ser, contudo, que no mundo académico não há espaço para a poesia, essa margem que devolve ao próprio leitor a capacidade de interpretar o que vê.

Fado macho


Com uns amigos, o Venus e os sogros todos aperaltados, lá aceitamos a proposta de ir a um jantar de fados num restaurante escondido nas profundezas de Avintes. O fado é aquela estranha mistura de melopeias e perfomances. Tudo tem de ser bem regadinho com tintol e de preferência com o bandulho cheio. É impressionante apreciar o tamanho das matronas que cantam, verdadeiras divas de subúrbios semi-rurais, mas o que marca mais é o trinado que imprimem às palavras, sejam elas dolorosas ou matreiras (é no saltitar bem conseguido entre um estilo e outro que se joga o sucesso de uma noite destas). A perfomance é uma total celebração do falocentrismo latino. O macho que encanta, apaixona, atraiçoa com outras e que desaparece do mapa é o motivo central, e é cristalizado nos dois discursos: o masculino e o feminino. Tudo é binário: é sempre o homem que toca na guitarra, frequentemente metáfora da mulher, que se deixa tocar, dominar. O que resta fora deste discurso é uma mistura de outros mitos: as alusões a Deus e quejandos divinos, um sentimento bairrista, clubista ou nacionalista, enchem as delícias de uma plateia completamente convertida, porque em sintonia absoluta com esta confirmação identitária.

A arte e o self


Ao escrever-me também me reconstruo. Leio-me no ecrã e tento escapar-me. Tomo consciência de algo que não estava lá, e de repente esqueço-me do que pensava que sempre lá tinha estado. Tenho-me apercebido, por exemplo, da importância que o cinema tem no meu percurso, mas já não reconheço a angústia de perder mais um filme imperdível. Alguns apetece-me mesmo evitar. Apareceu agora a adaptação de "Uma casa no fim do mundo", e tem tudo um ar tão dengoso e hollywood que eu, por respeito a um livro que praticamente devorei, vou recusar. Venha o próximo filme inesperado, por favor! I'm in the mood for heavy art...

Queer animals


I dated that guy two years ago and he´s STILL not out!
Não é lindo? Como diz um amigo meu: "Tão pipi!" :)

Volere Volare


Já não me lembro em que recanto da memória escondi o momento em que vi este filme (a tradução portuguesa seria "Querer voar"), mas recordo-me bem da sensação de liberdade que exalava, diferente de tudo quanto tinha visto até à altura. Para além de uma interessante curta-metragem totalmente animada, não consegui apanhar mais nada do Maurizio Nichetti, mas recordo-me de ele aparecer recorrentemente na TV italiana e de o associar à família do Roberto Benigni ou do Nanni Moretti: os cómicos de intervenção. O filme retrata as peripécias de um triste sonoplasta, que trabalha tanto para filmes de animação como para filmes porno (hilariante a sequência da sonorização de uma cena hard entre vários homens e mulheres). Ao enamorar-se de uma prostituta, a sua verdadeira identidade (realmente este tópico é viciante...) começa a emergir, e transforma-se numa personagem animada. A técnica é idêntica à utilizada quase na mesma altura no "Quem Tramou Roger Rabbit?", mas como se vê, a história movimenta-se por territórios mais... sugestivos. No auge do filme, um Maurizio ainda de carne e osso liberta-se de duas luvas animadas, que transportam a sua amada numa dança acrobática no céu de Roma, realizando assim a sua fantasia de infância. Imaginam algo mais romântico?

Asexual boys


De acordo com a última Zero, um novo grupo está a surgir, de novo sob a bandeira da identidade sexual. Desta feita, a particularidade é não haver propriamente uma inclinação sexual, mas antes uma reivindicação de ausência de desejo - a assexualidade. Seguramente surgirão adeptos, assim que se aperceberem que não são os únicos no mundo a contentar-se com um cafuné na cabeça (para os interessados, mais informações aqui). Dá que pensar, até porque todos vivemos um pouco a angústia da performance, que resulta da expectativa de corresponder ao que nos querem impor como normal: ter sexo, e do melhor! Ainda de acordo com a revista, o desejo pode efectivamente estar condicionado por uma série de situações conjunturais (não é o caso, os assexuais sempre foram desprovidos de desejo): stress, cansaço, depressão, má alimentação ou ingestão de bebidas alcoólicas ou outras substâncias, medicamentos, you name it! Também podemos estar sujeitos às variações naturais das estações. Mas a verdade é que quando nos aparece uma visão como esta aqui em cima, deve ser difícil lembrar-se de qual era a regra (se nos lembrarmos em que altura do ano estamos já é uma sorte)...
Imagem via Papparazzo

Nozolino em Serralves


Imagens serenas, tristes, melancólicas e muito belas, captadas por um português que percorreu mundo e que são agora exibidas em Serralves. Fui, vi e gostei muito. Recomendo!

Sentido único


E aos cinco anos descobria a diferença. O primeiro sinal: a asma. Não podia correr como via correr toda a petizada da rua. Por muitas ganas que tivesse, o fôlego traía-me a vontade e entrava em sufoco. O segundo sinal veio pouco depois, com a entrada na escola: não é que o lápis só se entendia com a mão esquerda? Ainda tentei, disfarçadamente e por iniciativa própria, fazer como os outros, tão aplicados e destros (ocorreu-me só há pouco esta terrível identificação: escrever com a direita equivale a destreza), mas logo tive que me render, e, no meu primeiro processo de outing, confessei angustiado a minha diferença. Por volta dos treze anos despedi-me de Deus. Tornar-me ateu foi um processo de libertação que ainda não terminou. Deixei de me sentir culpado por me masturbar, mas ainda dou comigo, ao olhar em meu redor, a ser minoritário. Um outro sinal de diferença cresceu com o tempo: ser melómano ou cinéfilo, amar a cultura como se tratasse da própria fonte da vida. Na altura não parecia ser esse o projecto de mais ninguém e também aí me senti em antítese. A homossexualidade só a deixei emergir mais tarde. Ao assumir ser asmático, canhoto, ateu ou homossexual, eu interiorizava a ideia de que não tinha sido feito para este mundo, estava como que em rota de colisão. Só com o tempo me apercebi de todas as outras diferenças que nos distanciam a todos, de uma forma ou outra da norma, que não se diz. Não se fala em não asmáticos, em crentes, destros ou heterossexuais, apenas se presume que as coisas são assim. Talvez isso explique esse ruído promissor que é o de uma estrada que se rasga noutros caminhos, ao lado de uma placa de sentido único.

O concerto de uma geração :)

Quem vem connosco ao concerto dos Humanos, no próximo dia 04 de Julho no Coliseu do Porto? Já estou empolgado!

Hanoi Jane


Pronto, confesso que sempre tive um apreço especial pela senhora. Não é apenas uma consideração artística, é também política, mas liga-se sobretudo à riqueza da personagem como um todo, e pela inteligência de conhecer perfeitamente a sua persona pública. Do altos dos seus 67 anos de idade, não hesita em continuar a mandar bujardas sobre a política imperialista americana, embora admita com a mesma candura que magoou muita gente ao posar junto das tropas vietnamitas no período mais quente da guerra. É impressionante a leveza com que personifica a maior promiscuidade cultural de que há memória: foi a rainha dos vídeos de ginástica caseira e não se faz de rogada para a futilidade do estrelato, mas também foi musa da elite cinematográfica e intelectual europeia (é verdade, nós adoramos apadrinhar as estrelas que caem em desgraça na América), chegando a filmar com Godard e presenteando todos com representações memoráveis. A foto é real e foi tirada numa detenção supostamente equívoca (posse de droga), apesar de muitos desejarem ver a alcunhada de Hanoi Jane nesta posição pelo simples facto de dizer sempre o que pensa e de ter sido uma activista todo o terreno durante toda a sua vida. Lançou agora a sua autobiografia (que deve ser um mimo), onde, entre outros rebuçados, fala da sua luta contra a misoginia interiorizada, que a empurrou sempre na busca da perfeição (e no combate à bulimia), da perfídia do pai (o all american hero Henry Fonda), e da sua recente conversão a uma religião de vedetas (penso que mesmo aqui já está a fazer das suas, ao afirmar que sempre viu Jesus como um feminista). A causa mais recente é a luta contra a gravidez na adolescência. Abram alas, a Jane voltou!

Vá lá, não carregues!

Waiting for the sun


Era assim uma música dos Doors, e resume bastante bem a minha personalidade na maior parte do ano...

God bless America

Life on ice


Num Domingo que prometia ser o mais caseiro e pachorrento dos últimos meses, acabei por me deixar convencer a ir com duas amigas a um mercado de roupa no impressionante edifício da Alfândega do Porto. O projecto não correu bem, tenho vindo a desenvolver um fobia por multidões, e quem me conhece sabe que tenho crises de ansiedade quando entro em lojas (felizmente eu e o Venus temos as mesmas medidas e vou 'herdando' periodicamente algumas peças). Resultado, perdi-me e acabei por fugir, refugiando-me no Café do Cais. Como não havia mais nada disponível, acabei por comprar num quiosque vizinho o último número da National Geographic. Indo ao ponto: divagando mentalmente, ia pensando nos trabalhos para a faculdade, tentando descortinar saídas. Pretender estudar a fundo o percurso de alguém, que é o que me intriga e fascina na meotodologia das histórias de vida, pode revelar-se uma busca surpreendente (ia desfolhando ao mesmo tempo a revista). A sensação poderá ser semelhante à daqueles espeleólogos que, ao investigar com sondas gigantescas as camadas de sedimentação do Ártico, descobriram a prova de que nem sempre aquela paisagem foi assim branca, mas antes um lugar verdejante e aprazível. Até a metáfora da cristalização, do gelo e das identidades, parecia contribuir para o paralelismo. É bom reconhecer que os investigadores, seja porque não encarnam a alma do entrevistado, seja porque não mergulham nas profundezas do Ártico, apenas penetram no objecto parcialmente. Mas não será esse, apesar de tudo, um trabalho imprescindível?

Antes de Stonewall


Para os que já estão por dentro, Stonewall evoca logo o acontecimento: em 1969, um bar gay nova-iorquino, precisamente com este nome foi o cenário de uma revolta espectacular contras as forças policiais que frequentemente realizavam rusgas ao local (rezam as crónicas que a arma de arremesso mais utilizada foram sapatos de salto alto!). O impacto foi tal, dentro e fora da comunidade, que a data passou a ser celebrada anualmente, sempre no dia do acontecimento: 28 de Junho. O gay pride espalhou-se progressivamente por vários países, e actualmente é assinalado numa boa parte do mundo, incluindo Lisboa.
Hoje à noite, no Pinguim, bar portuense sito na Ruo do Belomonte (perto do Mercado Ferreira Borges), passa o documentário Before Stonewall, que pinta um retrato dos primeiros passos no activismo neste campo. Guardem lugar para o Major Tom!
PS: a iniciativa é do recém-constituído GRIP - Grupo de Reflexão e Intervenção no Porto (irá aparecer pela orquídea mais vezes), em colaboração com a Cinema Invisível.





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