Fado macho


Com uns amigos, o Venus e os sogros todos aperaltados, lá aceitamos a proposta de ir a um jantar de fados num restaurante escondido nas profundezas de Avintes. O fado é aquela estranha mistura de melopeias e perfomances. Tudo tem de ser bem regadinho com tintol e de preferência com o bandulho cheio. É impressionante apreciar o tamanho das matronas que cantam, verdadeiras divas de subúrbios semi-rurais, mas o que marca mais é o trinado que imprimem às palavras, sejam elas dolorosas ou matreiras (é no saltitar bem conseguido entre um estilo e outro que se joga o sucesso de uma noite destas). A perfomance é uma total celebração do falocentrismo latino. O macho que encanta, apaixona, atraiçoa com outras e que desaparece do mapa é o motivo central, e é cristalizado nos dois discursos: o masculino e o feminino. Tudo é binário: é sempre o homem que toca na guitarra, frequentemente metáfora da mulher, que se deixa tocar, dominar. O que resta fora deste discurso é uma mistura de outros mitos: as alusões a Deus e quejandos divinos, um sentimento bairrista, clubista ou nacionalista, enchem as delícias de uma plateia completamente convertida, porque em sintonia absoluta com esta confirmação identitária.

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