Narciso e as mulheres maduras
Normalmente, tendo a ver sempre apenas o lado mau daquilo que faço. Como acredito que só podemos evoluir se acreditarmos naquilo que fazemos, tentei adoptar mais recentemente uma estratégia: carrego nos impulsos e não revejo aquilo que faço, para evitar deitar fora o que se pode mais cedo ou mais tarde até revelar importante. Daqui poderá surgir, um dia, quem sabe, qualquer coisa que realmente possa ter significado para outra pessoa, mas o que me tem acontecido pensar, nesta dinâmica, é que me transformo, paulatinamente, no narciso que aguarda, em cada um de nós, o baixar da guarda.
Ou seja, perdido por ser humilde, perdido por ser umbigo.
Quem me encontrasse na praia há uns dias atrás, apanhava-me a ler um livro de tias (com capa cor-de-rosa e tudo). Encontrei-o na Feira do Livro, e achei que podia ser engraçado para a minha mãe (a minha tia preferida), que se encontra em pleno período de mudança de trajectória (prestes a entrar na reforma, a menopausa onde já vai, com autonomia financeira e uma casa no campo, há muita coisa que se pode decidir nesta altura do campeonato). O livro chamava-se “Mulheres Maduras”(de Susan Swartz, Ambar), e no fundo é uma recolha de depoimentos bastante uplifting sobre a vida de uma série de mulheres, que a autora recolheu, compilou e articulou segundo áreas temáticas. Todas aquelas mulheres cinquentonas e sessentonas, que, com os filhos, matrimónio e carreira muito arrumadinhos decidem de repente romper com o passado e começam a realizar os seus sonhos verdadeiros de sempre, enterrados pelo rame-rame da sua vida adulta; fizeram-me pensar que não gostava de chegar àquela idade frustrado por não ter sequer tentado fazer agora aquilo que realmente me apetece. Com o empurrão precioso da Ju, lá peguei então nos meus sarrabiscos, preparei um cd com o portfolio, e fui com toda a latosa a uma editora apresentar o meu trabalho. Não sei se alguma vez isto dará nalguma coisa, e seguramente esta não será a única tentativa, mas já me sinto mais tranquilo por saber que pelo menos tentei.
Umbiguismos.