Bailando na capital
Sempre achei que o Sol de Lisboa me drenava as energias mais depressa do que em qualquer outra cidade. Em frente a um palco atapetado com cravos, dentro de um São Luiz à pinha, claustrofóbico mas eficaz, enlevados durante cerca de duas horas pelos movimentos e vozes de duas dezenas de corpos - os magníficos de Wuperthal - senti-me impelido de nova para a vertigem das grandes emoções, daquelas que nos fazem pensar em grandes mudanças, naquela necessidade de desnascer e encetar outra estrada. Não decifro o seu trabalho com palavras, mas agora vejo Pina Bausch como uma espécie de antena que capta e retransmite sinais vitais da existência humana (até o próprio batimento cardíaco), nunca deixando de expor desejo e dor como realidades complementares do ser humano. Pensava nisso enquanto passeava pela noite do Bairro Alto e assistia a uma outra coreografia de corpos nas ruas e dentro dos bares. Terminámos a noite no Frágil, cujo nome evoca com ironia a condição em que, paulatina e inexoravelmente, repousava. A rebelião do físico fez-se sentir no dia seguinte, um Domingo langoroso entre amigas. Apeteceu-me acreditar que a vida era tão simples e infalível como o sono da pequena Francisca.
Com excepção do São Luis ser claustrifóbico. é um excelente teatro «de ville»!